
Ingressar num novo ano é como adentrar em outra dimensão de nós mesmos. A vida que se desdobra. A porta se abre e nos brinda com o raiar de um novo dia. Cores que já estamos acostumados a ver, mas brilham de um jeito especial, diferente, porque vistas com o olhar de quem olha o verde da vida, que vai nascendo, brotando, desabrochando em recomeço. Então, olhamos para trás e despedimo-nos do ontem, do sábado e todos os dias anteriores enquanto o hoje pacientemente nos espera com os amanhãs e todos os dias que virão [até quando não sabemos. Essa é uma das peças que compõe o mistério].
Abraçamos entre lágrimas e sorrisos os dias idos e guardamos os momentos numa caixinha de memórias, como a um relicário de doces lembranças. Há coisas, no entanto, que queremos livres, nos desprender, deixar que o vento leve para longe [se retornadas que venham suavizadas pela marca indelével do tempo] outras tantas desejamos ardentemente esquecer ou nunca tê-las vivido, ao menos se pode dizer é passado, ainda que, por vezes, sombras rondem a casa do coração deixando vestígios de sua passagem. Passado que se faz presente em recordações, insistem em reaparecer mesmo quando se soubera esquecidas, burilando quase sempre a mesma ferida. Não sabemos os porquês de certas coisas e muitas vezes nos afligimos, seja pela perda de um amor, um projeto que não deu certo, a doença que nos pegou de surpresa, a morte de um ente querido, enfim. Mas se nada ocorre por acaso, se tudo em uma razão de ser e de existir por que nos questionarmos tanto e buscarmos entender àquilo que no momento não é possível ser compreendido? Clarice tinha razão: “Não procure entender, viver ultrapassa todo e qualquer entendimento”. E talvez viver seja isso, não para ser passível de se fazer sentido, mas para ser sentida, então, eu sinto. Sinto pulsando em minhas artérias o mistério que é a vida. Ela própria se explica, com o tempo.
Não inculque com certas coisas, nem lamente determinados fatos, o que viveu ou o que deixou de viver. O que passou não pode ser alterado, mas a vida nos dá uma nova chance de continuar escrevendo a nossa história. E cabe a mim, a você abraçar e aproveitar o presente que nos é dado. É certo que não sabemos o que nos espera, por detrás das folhagens verdejantes há uma imensa floresta, mas vale a pena prosseguir, correr todos os riscos, desbravar a mata virgem e colher a flor dos dias que germina na terra. ‘Não tenha medo de viver a vida, tenha medo de não vivê-la’.
O domingo nos recebe com uma folha em branco festa, ano novo, vida que se renova, nua flor, flor dos quereres.
Faça a sua prece! ♥
Angella Reis